Há uma coisa fascinante no mundo: a leitura. Não existe outra atividade tão avassaladora, tão poderosa e tão transformadora. Ler é um exercício que não precisa de mouse, nem de Wi-Fi, nem de modinhas — mas, paradoxalmente, é o único treino que faz o cérebro subir a escada da inteligência.
Só se sai bem na vida quem lê muito. E só lê muito quem lê por prazer. Aí está o segredo.
É por isso que eu digo, e repito: os professores de literatura deveriam deixar de ser professores de literatura e se tornarem professores de leitura. Porque o que a escola tem feito — e mal — é o contrário: em vez de despertar o prazer de ler, ela ensina a detestar os livros.
Pense: uma criança de 12 anos, cheia de imaginação, recebe o aviso do professor — “vou te fazer descobrir o prazer da leitura”.
E, em seguida, leva uma pedrada: “Toma, José de Alencar”.
Pronto. Nunca mais essa criatura chega perto de um livro.
Primeiro, o professor de leitura. Depois, o de literatura.
Porque ninguém começa subindo o Everest: quem quer aprender a gostar de ler precisa começar pelo caminho mais acessível — ler o que dá prazer.
Se você começar com Harry Potter, um dia pode chegar a Machado de Assis.
Mas se começar com Machado de Assis, sem preparo, não chega a lugar nenhum.
O livro certo muda tudo
Eu tive sorte. Aos nove anos, morando na Itália, fui buscar na banca de jornal o livro semanal da minha mãe — ela adorava Agatha Christie. O jornaleiro olhou pra mim e disse:
— Leva esse aqui, é novo. Ficção científica. Arthur C. Clarke.
“É de mistério?”, perguntei.
“É, mas é outro tipo de mistério. Uma espaçonave que vai pra Marte.”
Marte! Levei pra casa, abri o livro e… perdi o fôlego. Li, reli, devorei.
Foi uma das três grandes descobertas da minha vida — e, não, não nessa ordem: sexo, ficção científica e leite condensado.
Daí em diante, um livro puxou o outro. O número 2, o 3, o 4… hoje espero pelo número 1.700 da mesma coleção. Ninguém lê milhares de páginas se não for por prazer.
O leitor nasce do prazer, não da obrigação
Anos depois, meu filho de 15 anos chegou aflito:
— Pai, descobri que eu odeio ler.
E eu respondi:
— Que bom. Agora eu também estou preocupado.
Ele argumentou:
— Mas você lê muito, as minhas irmãs lêem, meus tios lêem… será que eu vou ficar burro?
E eu disse:
— Meu filho, você já é. Porque quem não lê, por definição, é uma besta.
Ele riu, mas explicou:
— Pai, eu já li um livro, aquele que a escola mandou.
Peguei o livro e li. Era sobre as crises místicas de uma galinha — e o Arcanjo Galo descia por uma escada de luz.
Disse a ele:
— Se esse fosse o primeiro livro da minha vida, eu seria analfabeto até hoje.
Não pedi pra ele ler. Pedi pra ele descobrir o prazer de ler.
A regra é simples
Foram escritos milhões de livros no mundo. Um deles foi escrito pra você.
A sua missão não é ler — é encontrar o seu livro.
Comece a ler qualquer coisa. Achou chato? Pare. Comece outro.
Achou chato? Pare de novo.
O perigo é achar, depois de cinco tentativas, que todos os livros são chatos.
Mas não são. Continue tentando.
Livro é como namoro: se tá chato, troca.
Depois de algumas tentativas, meu filho achou O Hobbit.
Devorou em dias.
— Pai, não sabia que um livro podia ser divertido.
Nesse momento, ele não achou apenas um bom livro — ele descobriu que ler é divertido.
E aí foi O Senhor dos Anéis, As Brumas de Avalon, Sherlock Holmes.
Hoje lê em cinco idiomas e trabalha em uma editora.
O poder transformador de um bom livro
A leitura muda o destino das pessoas. Uma professora de Santa Cruz do Rio Pardo me contou que seu irmão era um sujeito comum, corintiano roxo, que nunca lia nada — nem bula de remédio.
Até que um dia comprou um livro chamado Aventuras e Desventuras do Timão.
Começou a ler. Gostou.
Logo estava lendo biografias, história das Copas, Rivelino.
Dois anos depois, publicou seu próprio livro de poesias.
Um corintiano escrevendo poesia.
Isso é milagre. Isso é o poder dos livros.
Ler é o exercício supremo da inteligência
A leitura não apenas amplia o vocabulário, ela aumenta o QI, reorganiza o pensamento e ensina a pensar em sequência.
Cada página é uma academia para o cérebro, e o leitor é o único atleta que envelhece ficando mais rápido.
A escola deveria começar por aí: ensinar o prazer de ler antes de ensinar o conteúdo.
Porque ninguém ama aquilo que lhe é imposto.
E, como dizia o próprio Pierluigi Piazzi:
Livro é como amor. Só vale quando é por vontade própria.”
					
							